segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Depois da Guerra

Porque ainda permaneço aqui
E o meu corpo ainda vive
E a minha alma ainda se sacia com as poucas coisas que me trouxeste
Quero dizer-te que fiques mais um pouco,
A apodrecer nas minhas palavras,
Desmaiado nos meus lençóis.
Depois, quando quiseres sair
E seguir a tua viagem
Diz-me somente num sussurro que te vais,
Diz-me "até já" ou "até breve",
Para eu pensar que não demoras
E o meu corpo não ter o impulso de sair daqui
Para te agarrar e para te fazer convencer de que ficarás para sempre.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Decode

How can I decide on what's right?
When you're clouding up my mind
I can't win your losing fight all the time
Nor could I ever own what's mine
When you're always taking sides
But you won't take away my pride
No not this time.

The truth is hiding in your eyes
And it's hanging on your tongue
Just boiling in my blood,
But you think that I can't see
What kind of man that you are
If you're a man at all.

I'm screaming "I love you so."
My thoughts you can't decode
Well, I will figure this one out on my own.

How did we get here?
When I used to know you so well, yeah
How did we get here?
Well, I think I know.

Do you see what we've done?
We've gone and made such fools of ourselves.

How did we get here?
When I used to know you so well, yeah, yeah
How did we get here?
When I used to know you so well.

I think I know
There was something I saw in you
It almost killed me,
Because I wanted it to be true.

P. - H.W.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Take me to the water

Leave me there
To rest
To dream
To forget
To wash my sins
To cry
And maybe die
Drowning
In my own sorrow...

No silêncio da impossibilidade reside a segurança dos corações.



"Este vai ser o meu último cigarro" - Pensava ela ao aceitar da mão dele o calor vicioso.
Os olhos já estavam cansados de se encontrar, e a cumplicidade já estava terminada.
Cuidaram bem um do outro, regaram-se de liquidos, cresceram de certezas e incertezas.
A garganta estava irritada, de tanto fumo branco, de tanto fumo negro.
Mas mesmo assim, pelo saborear do último cigarro.
Em nome do último perder de vista aquilo a que chamava passado.
E ao devolver-lhe o cigarro os dedos tocaram-se. E as mãos dele eram quentes, as mãos dela belas.
Ao olhá-lo levando à boca o tabaco, chupando o fumo, engolindo-o, ela perdia-se naquilo que havia sido dito.
Olhá-lo era divino.
Mas a sua imagem desaparecia sempre quando ela desaparecia, por entre linhas e caminhos tão distantes que nem o horizonte conseguia atingir.
Ele dá-lhe novamente o cigarro, quase terminado.
Ela sente a saliva na ponta.
Trava o fumo, como quem crava a alma de alguém na sua.
E agora a imagem que ele representa estava gravada na sua mente, agora já não sai.
Ele sorri.
"Este foi o meu último cigarro." - Pensa ela ao pressionar o resto de cinza.
Apaga a chama. Não fica nada. Agora é uma beata.
Dão por si, olhando para o cinzeiro.
Erguendo as cabeças incrédulos, olham-se triste e pausadamente.
Levantam-se e abraçam-se incansavelmente.
E nisto relembram-se com rapidez inigualavel das bocas, das peles, dos cabelos, do suor, do sémen, dos gritos, dos suspiros.
Como que em transe despertam.
E ele fica, na exactidão de mais uma noite perdida.
E ela vai, para mais um passeio à beira rio, onde já não se vê a lua.
A liberdade dispersa-se nos corações, e as mãos, as mãos já não existem.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Douglas passei o teu limite.



Disseste-me: "vai, e nunca mais voltes!". A tua voz parecia amarga como fel.
Então peguei nos trapos rasgados e descalça desci a rua molhada.
Coxeava, como antigamente, era do frio e do medo.
Acreditei nas tuas palavras e agora via-te como um monstro.
Um deus caído, um demónio cruel.
Entre o ar cortante que me tocava a face e o liquido que ela vertia,
Eu ia congelando.
"Vai, e nunca mais voltes!" Ouvia outra vez no meu coração,
E a pontada aguda, deitava-me ao chão.
Tentava correr e fugir dali, com medo de alguém,
Mas não de ti.
Então, pus, pé ante pé, em velocidade estonteante,
A sentir nas minhas plantas o lixo cortante
Das noites embriagadas.
E num ápice deslizei entre a fronteira da dor e o horizonte da libertação.
Afinal, sabias que deixar-te, trazia-me um futuro bem mais brilhante!

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Animal




There was a time when my world was filled up with darkness,
And I stopped dreaming,
Now I'm supposed to fill it up with something.

In your eyes I see the eyes of somebody I knew before long ago,
But I'm still trying to make my mind up
Am I free or am I tied up?

There is a hole and I tried to fill it up with money
But it gets bigger to your hopes if you're always running.

In your eyes I see the eyes of somebody who could be strong
Tell me if I'm wrong.
And now I'm pulling your disguise up
Are you free or are you tied up?

I change shapes just to hide in this place but
I'm still an animal
Nobody knows it but me, when I slip, yeah I slip
I'm still an animal.

M.S.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Rapto as Palavras dos Velhos

Ao pé da coluna maldita, encontram-se. Olham-se nos olhos, quase sem respirar. O ar frio penetra-lhes as cabeças, nos pequenos recantos que os chapéus não sabem tapar.

Ali estão. O silêncio existe, porém uma amálgama de gritos e de nervosismo paira.

Os casacos escuros, uns sobre os outros na paisagem, fazem lembrar troncos de velhas árvores, quase mortas.

As nuvens taparam o céu e ao longe ouvem-se os carros passar furiosos na auto-estrada.

É chegado o momento.

Depois, acendem os cachimbos, um a um, como comboios de ferro, naquela antiga estação.

Um deles inclina-se sobre o círculo e sussurra.

Aquilo que ele sussurra? Não interessa aqui.

O que importa é que ao pé da coluna maldita se encontram. Olhando-se nos olhos, quase sem respirar. Deixam que o ar frio lhes penetre as cabeças.

E ali estão até ao fim do dia, onde o silêncio existe, encobrindo uma amálgama de gritos e de nervosismo.

Com os casacos escuros, uns sobre os outros na paisagem, fazem lembrar troncos de árvores quase mortas.

As nuvens cobrindo o céu, os carros passando furiosamente na auto-estrada.

É chegado o momento.

Depois de fumarem os cachimbos, um a um, como comboios de ferro, naquela estação abandonada.

O que sussurrava já não sussurra.

E o que ele já não sussurra não interessa aqui.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Hoje ouvi o Chico
E lembrei-me de ti.
De como falávamos tão livremente,
Como partilhávamos o choro da tua guitarra
Com as nossas vozes adolescentes.
Da tua casa, dos teus cigarros devorados
Debaixo de uma chuva intensa de Novembro.

Lembrei-me do lugar que ocupaste ali,
Tão discretamente,
As coisas que me mostraste e ensinaste,
O teu riso amigável e a nossa cumplicidade
Crescida de tantas filosofias sóbrias, inocentes, belas.

Conheceste-me bem,
Viste quem eu era
E sabias o que eu ia ser,
Na tua ternura olhavas-me com medo,
Com o medo de eu me perder na força que trazia em mim.

Tu sabias que a minha inocência ia ser perdida
Daquela forma tão cruel,
E Gabriel, a vida passou por mim assim
Mas eu continuo menina,
E a vida passou por ti e tu ficaste velho e sábio.

Eu pergunto-me, nestes dias de Inverno, de chuva miúda e de solidão errante,
Se tudo teria sido diferente se eu tivesse guardado o meu coração e a minha boca
E não os tivesse mostrado tão prematuramente.

E o Chico cantava hoje, a sua Valsinha
E eu sonhava ainda o meu sonho
Sonho de menina, tal e qual aquele,
De que um dia Eu e o meu Amor acordaríamos o Mundo com o nosso Amar.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Se a verdade se torna veneno...




Mesmo que com a minha boca eu rasgasse a tua garganta
A verdade que me apregoas não sairia mais límpida.
Mesmo que com as minhas mãos te arrancasse o coração
A melodia que brota no correr do teu sangue não se calaria.
As tuas palavras ecoariam da mesma forma na minha cabeça
Até aos fins dos meus dias
E a demência a que me entregas seria um dia poesia.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Watch her disappear

Last night I dreamed that I was dreaming of you

And from a window across the lawn I watched you undress
Wearing your sunset of purple tightly woven around your hair
That rose in strangled ebony curls
Moving in a yellow bedroom light
The air is wet with sound
The faraway yelping of a wounded dog
And the ground is drinking a slow faucet leak
Your house is so soft and fading as it soaks the black summer heat
A light goes on and the door opens
And a yellow cat runs out on the stream of hall light and into the yard

A wooden cherry scent is faintly breathing the air
I hear your champagne laugh
You wear two lavender orchids
One in your hair and one on your hip
A string of yellow carnival lights comes on with the dusk
Circling the lake with a slowly dipping halo
And I hear a banjo tango

And you dance into the shadow of a black poplar tree
And I watched you as you disappeared

T.W.

Carpideiras


Porque temos de ser nós sedentas de tudo?
Porque temos de ser nós embriagadas com silêncio?
Porque temos nós de encarar a vida como vocês querem?
Porque temos de ser nós a ceder?
Não encontramos abrigo nos rostos rudes dos desconhecidos,
Não encontramos palavras nos lábios que nos são tão queridos.
Palavras de conforto que não sejam senão breves quimeras
Dos tempos em que ainda brincávamos no colo dos nossos pais.
Porque temos de ser nós a percorrer o mundo?
Porque temos de ser nós a deixar tudo para trás?
Porque temos nós de trocar a nossa vida pelo prazer do vosso sorriso?
Porque temos de ser nós a dar?
Porque temos nós de abdicar do nosso ventre e da nossa carne para vos dar a vida eterna?

Dedicado a C.Leal.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Adeus, finalmente estou de partida para o nada.




Digo para mim
Como é errado aquilo que sinto
Ao ver-te seguir assim
Rude, descontente
A usares-me
A fazeres-me sentir impotente
E louco.
Fujo de ti quando desistes
E devia ter força para te agarrar
Para te cravar o meu nome nas costas,
Mas não, vou sozinho
Lavar a minha pele
E chorar
Rebuscando coisas que ficaram por resolver.
Não está certo sermos assim.
Tento lembrar-me do que correu mal no passado,
Para não o voltar a repetir,
Mas já não encontro nada
Já esqueci.
Porque amar-te,
Se isto é amar-te,
É como voltar ao zero
Voltar toda a existência
Ao contrário
Ser anestesiado
Sentir-me amnésico,
E no fundo saber que me vais deixar outra vez,
Mas acreditar em ti,
Sem te questionar
E sentir que isto já devia ter acabado
Mesmo antes de ter começado,
E mesmo assim querer estar contigo,
E saber-te no teu íntimo,
E aprender a amar-te,
Uma vez mais
E para sempre.

S.L.

Walking Around

Acontece que me canso de meus pés e de minhas unhas,
do meu cabelo e até da minha sombra.
Acontece que me canso de ser homem.

Todavia, seria delicioso
assustar um notário com um lírio cortado
ou matar uma freira com um soco na orelha.
Seria belo
ir pelas ruas com uma faca verde
e aos gritos até morrer de frio.

Passeio calmamente, com olhos, com sapatos,
com fúria e esquecimento,
passo, atravesso escritórios e lojas ortopédicas,
e pátios onde há roupa pendurada num arame:
cuecas, toalhas e camisas que choram
lentas lágrimas sórdidas.

P.N.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Não existem passagens


Vira do avesso o avesso que sou.
Há uma luz no canto do meu olho,
É um astro cadente que arde somente
Quando penso em ti.

Sopro e flutuamos
Na imensidão de números
E datas e refeitas alfabéticas que somos,
Inconstante fortuna que tento hipocritamente
Atribuir aos astros.

Não há nenhuma linha que nos dirija
Não há nenhuma música que nos cante
Ninguém parece exaltar-nos a cor,
Mas seguimos no extremos de nossas contradições,
Agarrados a horas e minutos espelhados.
Quanto mais rápido caminhamos
Menos tempo passamos aqui
Mais rápido é o fim.

Se mais Fevereiros houvesse
Seriam todos como tudo,
Seriam todos assim
A sonhar alto o recado que deixámos
Nas fotografias
Nos pratos
Nos rastos na areia
Na banheira
Nas línguas ensanguentadas
Nas unhas gastas
Nos cabelos caídos
Nos hematomas,
Enfim
Na nossa combinação binómica
Na tua chave estratégica
Na minha rua impedida
Para fechar as feridas
E escrever uma nova Poética.

S.L.

Antigonas




Na luz intermitente da rua
Elas seguem nauseabundas,
Nas suas formas:
Uma arredondada a outra obtusa.
Entre as peles macias e pálidas
O ódio nasce timidamente robusto.

Fortes feras
Que se inclinaram para a morte orgásmica,
Hoje caminham juntas.

Dos leitos que provaram,
Dos gritos que soltaram,
Resta agora o silêncio defunto dos corpos gastos.

Uma pára,
Sustendo-se na indecisão
Do vómito e da culpa.

A outra agarra-a,
Sem vontade,
Os seus lábios cheios de indiferença
Estão selados.

Não sai nada daquele corpo redondo e triste.

E a outra vomita o excesso de whisky,
O excesso de merda que engoliu
Porque não sabe fazer outra coisa.

Limpa-se ao casaco,
Está pronta.
Continuam.

Entram no nevoeiro e perdem-se
As mãos tentam encontrar-se.

Não há socorro aqui,
Não há luz, não há fado.

"Inês, estou cansada, vou voltar para trás."

domingo, 14 de novembro de 2010

The stillness is the move

Isn't life under the sun just a crazy dream?
Isn't life just a mirage of the world before the world?
Why am i here and not over there?
Where did time begin?
Where does space end?
Where do you and i begin?

After all that we've been through,
I know we'll make it after the wait,
The question is a truth.

D.P.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Quanto

Fotografia de Ligia Santos.


Sobre o beijo pousei a minha boca,
Rouca não consegui mais falar-te.
Impressionei-te com as minhas coxas e as coisas que me disseste fizeram-me viajar.
Para onde?
Não sei, acho que me perdi entre o teu umbigo e o teu pescoço tatuado de sinais.
A vertigem a que nos propusemos sem pensar libertou-me do tempo,
A luz quente que me envolveu deixou-me nua,
Dentro de caricias fiquei, até que o laranja do teu palato cobriu a sala.
A tua saliva escorria na minha pele.
Pelos cabelos agarraste-me sem fôlego, e entre suspiros e sussurros mentimos aos nossos corpos.
Tocaste as minhas extremidades.
Mediste-me sem medo de ombro a ombro, de cavidade a cavidade, da cabeça ao coração, do coração ao ventre, do ventre à alma.
E quando sobre o beijo pousei a minha boca fiquei louca por ter de partir.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Lentidão



Uma mancha de mosquitos voou sobre ti, e as máquinas trabalhavam à tua volta.

Pedra sobre pedra, betão sobre betão, destruíram aquilo que conhecias.

Não restou nada.

E agora ergueram a masmorra a que um dia chamaste coração.


quarta-feira, 3 de novembro de 2010

16:9

Molhei-me.

Pus as mãos no parapeito para ver melhor,

Inclinei me sobre o precipício da rua,

Via todos, lá em baixo, viver repentinos

E vi-te passar.

Alta, esguia, branca.

O teu casaco preto esvoaçava com o passar dos carros,

Trazias nas mãos as luvas.

Devorei o cigarro, e atirei-o com destreza para o meio da rua.

Entro então em transe,

Vou seguir-te.

Agarro a minha mochila e o meu cachecol,

Desço as escadas do teatro,

Quase deixo cair uma senhora idosa

Que vinha sorrateiramente subindo

Agarrada ao corrimão dourado.

Dou três pulos, vou a voar até ti.

Chego à rua.

Um monte de miúdos hiperactivos por ali espalhados

Impedem-me a passagem.

Por momentos, quase penso que te perdi,

Mas vejo-te atravessar a estrada,

Determinada em chegar à outra margem.

Estou viciado em ti,

Nesses teus cabelos de cobre,

E não te quero para nada.

Sigo-te, no entanto.

O teu cheiro antigo

Demasiado doce,

Demasiado quente,

Instiga-me a perseguir-te.

Presa, presa

Não nos meus braços

Não na minha boca

Não na minha mente.

És presa do meu instinto demente,

És musa.

E nisto sobes a rua.

E sabes que te sigo.

Páras, subitamente.

E eu paro.

"Não te quero para nada" digo.

Viras-te para mim,

Como uma corrente forte de água e lama

Frio e sujo, sinto-me no chão.

Estás a chorar,

E eu não estava à espera.

"Não me queres para nada?" – perguntas-me.

Anuí.

"Então sou eu que te persigo,

De costas voltadas para ti,

No meu caminho íngreme e ingénuo?"

Desarmado estou,

E na tua simplicidade aproximas-te

Lacrimosa,

Abraças-me.

E num momento, estou sozinho, no meio da rua,

E estou livre da tua loucura.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Nove


Porque a tarde me custa tanto

Sabendo que já não dormes

E mesmo assim, no silencio,

Escorres na minha mente

Que tenta adivinhar

O teu paradeiro.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Me Digo


Na luz sibilante da tarde, encostado a uma parede, enroscava-se no chão. Entre as linhas grossas do seu tronco branco, vagueavam parasitas. Atrás das suas orelhas os cabelos enrolavam-se em grossas postas. Cheirava a mijo e a vinho.
Em câmara lenta precipitou os beiços para a frente, e em contra-luz a saliva saiu da sua boca negra e podre, num fraco tossir. Brilhava a saliva ao sol, flutuando até cair na calçada. Pobre despido imundo, sobre um pedaço de cartão, suava como um porco da febre que tinha.
Acabara de acordar. O seu ventre encolhido da fome, secava. Então baixava a cabeça e encostava a boca ao chão, sorvendo dele alguma água que restava da chuva passageira. Com pouca firmeza meteu os pulsos no chão e esticou as pernas para se levantar.
Nas ruas da cidade, os restantes transeuntes apressavam-se para o jantar. Nas linhas que escreviam, arrastavam atrás de si um vento frio cortante, que quase deixava o pobre homem cair.
Seguindo pé ante pé lentamente, com as curvas do seu corpo em tons de óleo, sentia com as plantas as fissuras do alcatrão. Aqui e ali vislumbrava uma beata ou outra, menos gasta, para matar o vicio do fumo. Mas nada.
O sol já não embatia no prédios húmidos, e das bocas ofegantes saía agora uma fina nuvem de vapor.
Sentou-se na escadaria de uma igreja, observando o mundo à sua volta, crepitante. Os carros acendiam as luzes, um a um, até iluminarem as estradas.
Respirava lentamente, com fôlegos minúsculos, descompassados, na tentativa de recuperar forças anciãs para se deslocar até ao destino desejado.
Na praça apenas a água da fonte cantava. Olhando as estátuas que ali pararam, verdes e calcárias, sentia-se menos só. Pensava também ele um dia petrificar, sem dor, sem frio, sem medo.
Seguiu em frente, descendo a rua. Agarrando-se às paredes, às portas e aos postes. Os olhos cansados queriam-se fechar. Então engolia a saliva espessa, erguendo a cabeça e soltando os cabelos negros para trás. Com a mão trémula e enrugada tocava a cara suja.
Caminhou até chegar ao rio. Sentou-se na margem, ao lado de um barco frouxo e ferrugento. Despiu desajeitado a pouca roupa que tinha. Ali nu e magro, ficou na escuridão do cansaço.
Erguendo se uma última vez, chorou de dores, chorou de pânico. Chorou porque não sabia o que sentir, porque nunca desejara verdadeiramente aquela condição pagã a que se entregara há tantos anos, porque nunca pensara ansiar tantas coisas insignificantes quando aquele momento chegasse. Porque nunca pensou que quereria viver outra vez, e ser outra vez outro corpo, e outra vida, e outro homem.
Naquilo que é vazio não há fim, há uma infinita solidão, uma infinita tristeza. Nestes espíritos que vagueiam as cidades, não há esperança de que o turbilhão da vida passe por eles, porque morreram antes do último suspiro.
A alma daquele homem vagueia a cidade para sempre, porque ficou presa ao mundo antes de se libertar daquele corpo imundo.
Ás vezes, ao final dos dias, quando o sol desaparece e tudo se acalma, ás vezes, olho o rio e vejo-o, e ele vê-me, e diz-me coisas numa língua estranha, que não sei entender. Ás vezes, dispo-me com ele e ficamos à beira rio, à chuva. Ás vezes sou também eu um defunto sem alma. Ás vezes somos o silêncio do mundo e o tormento do fim.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Steadfast Peace

Once upon a time, while I was still in my early years of youth, and every rain drop was like a thrilling drop of poison to my soul, I’ve met you.

You were also young and strong in your body and beliefs, but your eyes always seem to show me some kind of desperate need.

So one morning, you’ve touched my hand, and I couldn’t leave you there.

We’ve cross the city under the storm, water in our eyes. We were crying and smiling together for our misbehave.

And I was feeling that I was saving you from monsters, like some kind of ancient heroine, but I realize that you took my hand too, you were running faster than me, maybe more determined. You saved me from the dark clouds that have been chasing me through years.

So we reach the sea, and stopped for a while in the warm sand. We lay down our bodies and touched each other so we could remember who we’ve loved.

And so our hearts came out of our chests, like octopuses they swam to the oceans of blue and deep waters to find the center of the earth and rest there in steadfast peace.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Rehab

Fall in love or fall in hate.
Get inspired or be depressed.
Ace a test or flunk a class.
Make babies or make art.
Speak the truth or lie and cheat.
Dance on tables or sit in the corner.
Life is divine chaos.
Embrace it.
Forgive yourself.
Breathe.
And enjoy the ride...

SB

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Rightfully

Feel it burning like a bomb raging a thousand summers grazing on your skin restlessly anticipating so many tiny things.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

"Eu queria ficar para sempre, mas não posso. Desculpem."

Então, devias serrar os punhos,
Levantar a pesada cabeça que carregas sobre os ombros,
Suster a tosse convulsa
E enfrentá-los.
Derrotar na terra
Aquilo que ela sozinha não consegue engolir.
O vómito seco que te sai
Quando não consegues dormir
Não te faz esquecer a presunção insultuosa
Que é este existir.
Então, devias abrir os olhos e nem sequer pestanejar
Viver à guarda sem desejares alcançar
O mesmo triunfo que eles.
A tua raiva é a tua honestidade,
O teu coração sucumbe à insanidade
E já não sabes controlar os teus impulsos mais trementes
Dormentes estão os teus músculos,
As tuas veias saltam ao vê-los passar.
Então, devias soltar esse grito de guerra,
Deixares a defesa e passares ao ataque.
Não digas que é por mim que não vais à luta
A tua disputa é também a minha.
Então devíamos morrer por esta causa
Mas a fome é mais que muita,
Por isso não erguemos as nossas pesadas cabeças
Que carregamos sobre os ombros,
Engolimos o ódio
Permanecemos no sufoco
De sermos nós lobos
Nestas peles de cordeiros
De sermos nós guerreiros
Nestas vestes de santos
De sermos nós tanto
Nesta terra de pouco.

domingo, 17 de outubro de 2010

Deep and primal yearning

I undressed you, with my eyes i have maybe even raped you in a dark and eerie corner of my mind. I tucked you there and touched you in a dream last night, pushed you aside when you entered my thoughts at the wrong time. I have sat up upon your lap and saddled my thighs around your hips like ropes. I rode you on a chair and in the shower and all the while i clung heavy to your back. My desire deeply harnessed in your spine. I'm riding recklessly though a thick and humid jungle growing anxious with the deep and primal yearning that stirs, deeply pulsing up toward the surface like sap rising or honey or tar.

CR

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Moloko

Vivaz o corpo que agarra o corpo

E a luz que têm no encontro

Suave e lentamente eloquentes

Os poros que tocam os poros

Os cabelos que se confundem

Nos tons despidos das peles

As mãos nos braços

A força violenta com que agarram

E marcam

Para agitar o outro corpo

Na garganta seca do fumo

Solta-se uma gargalhada funda

Breve

E com olhar ríspido e desconfiado

O outro corpo pára a caça

E está atento ao que se passa lá fora

Acordado daquele quadro mecânico

Encontra outro corpo quente

Agarrando a sua presa sente

Que está desarmado

E não larga o corpo

Encosta-o contra o seu

O calor persiste

Mas trementes

Engolem em seco

O medo

Corpo com corpo defendem-se

E na eminência da luta

Com o outro corpo desconhecido

Hesitam um momento

Suspirando aos ouvidos

E sem terror é o corpo rival que se precipita

Abrindo o frigorifico

Retirando o leite

E voltando para a cozinha.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Once upon a time...

There was a girl who talked to the geese
She understood them and they her
One day she looked into a crystal stream
And saw in its bed a diamond
She picked it up and placed it in her hair
As she did so she turned into a geese
It was then revealed that the other geese
She magically had understood
Were once human like her.

CC

sábado, 9 de outubro de 2010

Galeria

Olho para mim reflectida no outro lado do pátio
Por entre o desejo ardente e o deserto gelado.
Quem me persegue? Quem corre para me agarrar os cabelos
Para me fazer cair na areia cortante?
És tu? É ele? E o outro não veio também
atrás deste feitiço que me fizeram engolir?
E é tão falso esse feitiço por dentro não há nada.
Há um caos e um silêncio brando de tantas bocas
Que querem provar deste veneno.
E o silêncio mata
Como mata a falta que tenho de mim.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

E à noite, eu já não era homem sob o peso dos mortos

A: Cumpri a minha missão.

C: Cumpre a tua última.

A: Eu matei pela revolução.

C: Morre por ela.

A: Cometi um erro.

C: Tu és o erro.

A: Sou um ser humano.

C: O que é isso?

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

He said to me:





Shut the door, shut the door because I'm staying here. 
The world might disappear under blankets of snow.
  "Anne!" 
There's a wonderful word that you will liken it to but it's caught in the back of your mind though.  
Okay, and some will say "to you will go the world" 
Shut the door because I disagree. 
And Memnon sighs relief. 
Some circles you can't leave.
TNP

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Je vois la vie en rouge.

“Saga, que saga

Quem paga as minhas dívidas?”

Pensava ele ouvindo Edith,

Cagando na sanita,

Riscando o jornal com os olhos.


A torneira da banheira deixava um rasto

De calcário amarelo na loiça branca.


Cheirava a podre,

Estava calor

E o suor da casa escorria pelas paredes de papel forradas.


Mais afastado deste quadro, num canto da cozinha suja

Passeava uma barata grande e gorda,

Dando um toque de beleza natural

Aquele quadro tão impecavelmente decadente.


“Edith, salva-me.” – Dizia ele para o espelho,

Preparando-se para fazer a barba.


À volta dos olhos as rugas,

As ramelas,

No canto da boca rude, um resto de saliva seca da noite.


“Aqui não cheira a rosas.” - Pensou.

E enquanto Edith cantava,

Facilmente com o fio da navalha

Se libertou um jacto fino de sangue.


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Coco Prado

De manhã, sentas-te por breves momentos à mesa, na cozinha. Entornas o leite no chão. Abres a tua boca envolta de rugas e barba, a tua saliva é espessa, e o teu hálito é inevitavelmente matinal, sorves o leite com tanta pressa, fazes me ficar ansiosa, fazes me ficar nervosa.

Tremem-te as mãos. Estás atrasado para a apartação.

Não quero ir contigo, vamos embater contra qualquer verdade cruel e eu não sei se quero lutar contra a morte. Sinto-me cada vez mais inútil.

Tremem-te as mãos. Entregas-te às drogas. Ficamos aqui olhando o céu, até chover. Os cigarros que fumamos vão ficando molhados, e as chamas apagam-se. A terra à nossa volta transforma-se em lama.

Tu já te foste, partiste. O dia já passou e eu não vi nada, senão breu e trevas.

Vem buscar-me. Prefiro morrer contigo na pressa de ser fiel aos compromissos injustos do mundo, do que definhar na crueldade da indiferença.

Então pegas-me ao colo, como se eu voltasse a ser pequenina em teus braços, e como se tu voltasses a ser vigorosamente jovem. Eu escorro água, lágrimas e sangue. No meio de tanta dor, não me sinto.

Não sei o que aconteceu. Não sei onde estou. Não sei quem me leva. Não sei para onde me levam.

Dói-me o corpo, dói-me a cabeça, dói-me o coração. As minhas mãos estão fechadas. Caí e tu não me levantaste.

Esqueci-me que já não estás aqui. Só agora percebo que perdi o teu fim.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Friendly, friendly fight



Acordo sobre o teu peito gélido
Depois da queda,
Sorris-me como sempre
Honestamente.

Estou mais leve,
Isto sou eu e mais nada.
Despida de tudo.

Para quê alimentar feras famintas de guerra se só o que desejo é paz?

Já não tenho medo,
De mim, nem da morte
O instinto violento da noite
Revela segredos.

De repente sinto a tua mão na minha
A odisseia de luzes que nos persegue,
A quantidade de ruídos que os meus ouvidos
Já não conseguem distinguir.

Sinto nas tuas veias
Ardente o sangue
Ardente o veneno.

Olho-te nos olhos
E sorris-me como sempre
Honestamente.

Estou só, depois da queda,
Isto sou eu e mais nada,
À porta do Mundo.

Para quê alimentar feras famintas de mim, se o que quero és tu?

S.L.

domingo, 19 de setembro de 2010

Awake forever in a sweet unrest



Can death be sleep, when life is but a dream,
And scenes of bliss pass as a phantom by?
The transient pleasures as a vision seem,
And yet we think the greatest pain's to die.

J.K.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Mandrágora de Rúben

Aprendi, meu senhor, a ser o esfregão que lava o chão que pisa.
Aprendi, meu senhor, a ser o branco rancor das suas camisas, que leva sempre engomadas.
Aprendi, meu senhor, a ser o sal dos seus lençóis, quando de manhã parte e o calor do seu corpo sucumbe à arte do tempo.
Aprendi, meu senhor, a abandonar a sua beira, quando à mesa se senta para saborear o jantar.
Aprendi, meu senhor, a queimar a lenha que aquece a sua casa nas noites solitárias de Dezembro.
Aprendi, meu senhor, a remendar com minúcia os seus fatos, a engraxar os seus sapatos.
Aprendi, meu senhor, a ser em tudo sua, mas da sua boca não sai palavra de conforto, dos seus gestos graciosos não se formam carícias, nos meus seios não procura as delícias que lhe fariam viver os desejos esgotados na pele limpa da sua primeira mulher.
Aprendi, meu senhor, em tudo a ser fiel, em tudo a ser honesta, em tudo a amá-lo,
Mas aprendi que para si não há mais mulher senão Raquel.

domingo, 22 de agosto de 2010

Do you want to fall not ever knowing who took you?

Don't talk down to me. Don't be polite to me. Don't try to make me feel nice. Don't relax. I'll cut the smile off your face. You think I don't know what's going on. You think I'm afraid to react. The joke's on you. I'm biding my time, looking for the spot. You think no one can reach you, no one can have what you have. I've been planning while your playing. I've been saving while you're spending. The game is almost over so it's time you acknowledge me.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Azarius



Ele dança à tua volta


Faz te sorrir


Seguindo vigorosamente


Os ritmos psicotrópicos


E as luzes incandescentes


As suas mãos elásticas


Envolvem-te a cintura


E agarra-lo ardentemente


Com a tua língua


De sabor a vodka e baunilha.



Os vossos corpos flutuam


E já nem os vidros nos pés sentes


É tudo azul e lilás


O teu estômago audaz dá três voltas


E de repente


Chovem cristais dos teus olhos.



Vomitas a violência das palavras


E atinges certeiramente


O teu companheiro fiel


O teu ecstasy sagrado.



Num instante


A tua overdose de verdade


Mata toda a tua sanidade


E tu estás longe de encontrar a metadona.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Monólogo da Intima

Os meus olhos estão cada vez mais cansados, e ardem.
Tento manter-me acordada.
A viagem é sempre longa, quando quero chegar até ti.
Não tenho vontade de pousar os pés no chão, de andar, de me esforçar no martírio que são estas escadas malditas.

Mantenho-me intacta. "Não me partas, não me forces a entrar na tua vida."

Abandono-me, dispo-me.
Visto outra pele, e até o meu cheiro muda, e é disso que gostas.

Vagueio na noite, entre bordeis e prisões.
Estou cansada deste passo altivo que finjo ter, desta postura dura e direita, da máscara que colo à cara, para agradar.

"Raios te partam. "
Assustas-me, tenho medo de te encontrar no virar da esquina, e acima de tudo tenho medo de te encontrar dentro de mim.

Bebo e bebo até cair, até rebolar nas minhas próprias palavras. Até arranhar os joelhos, até esfolar a cara no chão.

Ah, quero me libertar deste corpo! Desta alma que me aprisiona!
Nem sequer quero ser apenas uma Ideia, não quero que ninguém me pense,
E muito menos quero que me olhem!
"Parem! Já chega!"
Eu não sou eu
E não quero ser!
Quero ser Nada!

Calei-me, por instantes,
Já não ouço a minha voz irritante.
Corro até à casa de banho, olho-me ao espelho.
Quem é esta pessoa que vejo?
Arranjo o cabelo, sem sucesso. Respiro fundo, averiguo o meu estado
O meu corpo repleto de merda.

Saio dali, porque tem de ser, porque aquilo não dura sempre.
E para meu mal, encontro-te no fundo do corredor
Às escuras, e choras.

"Não tenho paciência...", digo-te. Mas tu agarras-me o braço,
E violento roubas-me um abraço que não quero sentir.
Fico sem palavras, fico sem fôlego, fico sem medo, fico sem mim.

Na escuridão daquela casa vamos aos trambolhões,
Tropeçando aqui e ali,
Naquela tábua, naquele corpo.
Nem sei como terminou esta guerra, mas tudo está deserto
Cheira a morto.

Não sei para onde me levas, não tenho lar para onde voltar
Não tenho pais, nem irmãos que me queiram abraçar.
Vou, perdida.
Vou, resignada, porque és a minha única opção.

Depois,
Cuido de ti, dou-te banho,
Dou-te dinheiro,
Dou-te amor,
Porque me salvaste daquela batalha,
Porque me limpaste as feridas,
E me mostraste que não preciso de máscara para sobreviver,
Para ser bonita.

Tenho uma divida para contigo,
Que não sei como terminar de pagar,
Porque achas que já estou curada,
E deixaste de me levar pela mão,
Ou ao colo,
Deixei de poder abafar as minhas mágoas no teu peito.
Deixei de ser a concubina eleita.
Deixei de ser eu.

Finalmente, tenho aquilo que quero,
Um corpo sincero onde cravar novas marcas.
Então num acto de sacrilégio entrego-me a ti.
E matas-me.

Um golpe aqui,
Um golpe ali,
Para não doer tanto.
Não há dor, és o que quero
És a morte que eu desejo.
E lenta, suave e delicadamente
Sou sangue e leite e mel
E suor e lágrimas.
E matas-me.

Matas-me.

Morri.